Casa dos Gandarinhos por Aniceto Carvalho

Seguem-se algumas memórias desta casa e dos seus proprietários deixadas por Aniceto Carvalho, e que correspondem ao período em que habitou em Couchel, entre 1935 e 1947:[1]

Rua principal vista do alpendre, 2016
Rua principal vista do alpendre, 2016.

Fim da subida da ladeira de Couchel, no Alpendre a rua faz uma curva pouco acentuada à direita, a poucos metros a casa dos Gandarinhos.

Embora pequena e piso térreo, frente ao portal do Diamantino, encostada à adega do Ti António Henriques, pelos padrões de Couchel a casa dos “Gandarinhos” era uma casa bastante razoável, não muito antiga.

Apesar de mal os ter conhecido, salvo erro os Gandarinhos eram três: Duas irmãs, a Maria e a Celeste, e um irmão, que nunca conheci, parece que pouco sossegado com quem a minha avó me comparava muitas vezes.

A Celeste, casada com o Manuel, tinham uma filha, a Ondina, uma miúda que, ou por ser um pouco mais velha do que eu, ou por irem pouco à terra, mal me lembro dela dessa altura. Cerca de uma década mais tarde, talvez um pouco mais, estaria nos meus vinte anos, estive em casa deles em Alcântara. Apenas a Celeste estava em casa. Até hoje. Só voltei a ver a Leontina em 2010.

A Maria era casada, ou coisa assim, com um indivíduo enorme, ao que parecia um tipo extraordinário, de Carregal do Sal, um concelho na Beira Alta, não muito longe dali. Só podia. Talvez não fosse bem assim, mas achava eu que para aturar a Maria o grandão da Beira Alta só podia ser um santo.

A Celeste não, mas a Maria todos os anos vinha a Couchel de passagem para a terra do marido. Ficava sempre um ou dois dias. Possivelmente ansiosa por julgar não ter tempo de contar as novidades de Lisboa com vagar, engrenava a falar logo que chegava, uma hora depois, totalmente eufónica, ninguém lhe conseguia ouvir uma palavra. Todos os anos… era fatal.

No meu tempo de escola, um ou dois anos antes de deixar a terra, quem vivia na casa dos Gandarinhos era o Joaquim Catrapeiro. Embora não me lembre do nome, nunca mais me esqueceu a simpatia e bondade da mulher dele. […]

Tinham dois filhos: Um rapaz, quatro ou cinco anos mais novo que eu, e uma miúda pequenita. Estariam na terra ocasionalmente: Problemas de trabalho ou coisa assim… Couchel era um refúgio em casos desses.

Aniceto Ferreira de Carvalho nasceu em Março de 1935, na localidade de Vale de Vaz. Cresceu em Couchel e, terminada a 4ª classe, foi trabalhar para Rio de Mouro (Sintra). Aos 17 anos ingressou na Força Aérea Portuguesa como mecânico de avião e mais tarde como especialista mecânico de material aéreo. Veterano da Guerra do Ultramar, faleceu no mês de Março de 2020.

Fica a nota aos leitores que o mesmo deixou nos seus escritos:

Que fique bem claro: Nenhum dos epítetos locais ou situações vividas tem a menor intenção de menosprezar seja quem for.