Casa dos Martins por Aniceto Carvalho

Seguem-se algumas memórias desta casa e dos seus proprietários deixadas por Aniceto Carvalho, e que correspondem ao período em que habitou em Couchel, entre 1935 e 1947:[1]

Em meados da década de quarenta, dos trinta e dois jovens de Couchel entre os vinte e os trinta anos, apenas seis teimavam nas dificuldades da terra aos riscos de outras paragens. Além destes restavam na aldeia seis miúdos a fazer a Quarta Classe para dali sair logo a seguir, os avós deles a entrar na terceira idade, e alguns pais destes à espera dos últimos dias neste mundo.

Com os Martins foi diferente: Numa família de oito pessoas, em cerca de quatro ou cinco anos a morte tinha-lhes levado mais de metade.

Um primeiro andar de sobreloja, um pátio interior, currais, arrecadações. Pegada com a do Matias, creio que por parentesco entre as duas famílias e os Pedroso de Vila Verde, não sei se por isso aparentemente mais farta, embora de estilos semelhantes aos das outras duas vizinhas, com a do Senhor Duarte, em frente, a casa dos Martins era de construção mais recente.

Sete pessoas: O velho Martins, que me esfregava a barba na cara e me fazia ir aos arames, a mulher dele, uma bondosa senhora da qual pouco me lembro, o Albano, paraplégico, irmão de um dos dois, me que levava a passear no triciclo de verga, os dois filhos, o Joaquim, que tinha uma quinta em Santa Clara, em Coimbra, o António, que estava com os pais, e dois rapazes de vinte anos, netos, o Armando, filho do Joaquim e o António, do António.

Em meia dúzia de anos morreram quatro da família: O primeiro foi o filho do António, com vinte anos, de tuberculose; a seguir foi o Albano, depois foram o irmão, o velho Martins, e o filho António quase logo atrás.

Não sei porquê, não me lembro de ter conhecido a mulher do António, a matriarca da família morreu ainda eu estava na terra.

De uma família de oito pessoas, (fora os parentescos de Vila Verde), quando saí da terra restavam o Joaquim Martins, a morar em Santa Clara, em Coimbra, e o filho, o Armando, nessa altura já muito longe de Couchel.

Aniceto Ferreira de Carvalho nasceu em Março de 1935, na localidade de Vale de Vaz. Cresceu em Couchel e, terminada a 4ª classe, foi trabalhar para Rio de Mouro (Sintra). Aos 17 anos ingressou na Força Aérea Portuguesa como mecânico de avião e mais tarde como especialista mecânico de material aéreo. Veterano da Guerra do Ultramar, faleceu no mês de Março de 2020.

Fica a nota aos leitores que o mesmo deixou nos seus escritos:

Que fique bem claro: Nenhum dos epítetos locais ou situações vividas tem a menor intenção de menosprezar seja quem for.