Vila Albertina, Vila Helena

Como nos descreve Aniceto Carvalho nas suas notas “Retalhos de Couchel”, as casas desta quinta, “as últimas de Couchel, antes do Seixo Branco, ocupavam uma boa parte da rua do lugar: da adega, a seguir à casa das Piloas, em frente da quelha do Valezinho ao pomar, este por trás da casa de habitação, bem em frente das janelas da Casa das Fontainhas”.

Manuel Vaz de Carvalho nascido em 1847,[1] casou na década de 70 do século XIX[2] com Ana Emília de Carvalho.[1] Tinha como cunhado o Padre Francisco de Carvalho Lucas, irmão da sua esposa e herdeiro de metade da sua herança.[1] Morava nesta quinta, tendo ainda a sua cargo a quinta da Avessada. Deste casamento resultaram cinco filhos, dois rapazes e três raparigas, tendo o seu filho Antonino, nascido em 1877,[1] assumido mais tarde a gestão das quintas. Albertina Vaz de Carvalho, irmã de Antonino, ficaria a viver na Casa da Avessada.

É então que em 1919 é noticiada a tragédia: “Antonino Vaz de Carvalho, por causa de uma torneira, altercou com sua irmã Albertina Vaz de Carvalho, acabando por agredi-la com a mesma torneira e desfechando contra ela uma espingarda, cuja descarga se lhe foi alojar no ventre, falecendo duas horas depois. Comunicado o caso ao administrador do concelho de Poiares, este mandou imediatamente cercar a casa do assassino, procedendo à sua prisão”.[3] Antonino deu entrada na cadeia da comarca, em Penacova, onde se suicidou. O corpo seguiu para Braga, onde a família da viúva possuía um jazigo.[4]

A recém viúva chamava-se, tal como a falecida irmã de Antonino, Albertina, mais concretamente, Albertina da Conceição Guimarães Nogueira Vaz de Carvalho[1]. É possível que esta tenha decidido voltar para junto da sua família em Braga, pois alguns anos após a tragédia a propriedade é colocada à venda. Esta é anunciada nos jornais, como se pode ver na Gazeta de Coimbra de 13 de Novembro de 1923[5] ou na Comarca de Arganil de 10 de Janeiro de 1924: “Prédio denominado «Vila Albertina», em Couchel, no concelho de Poiares — composto de casas de morada, abegoarias, terras de semeadura, olival, grande extensão de matos, mobiliário, engenhos de tirar água, etc. A 500 metros da Estrada da Beira. Dirigir a Albano D’Andrade, na Lousan.”[6][7][8]

A Quinta viria a ser comprada por Abel Inácio Ferreira, de Venda Nova, a viver no Bairro Santos de Lisboa, após o seu casamento[2] com Helena Anahory Ferreira.[9] Conta Aniceto Carvalho: “Não era todos os dias que um homem com uma filha na puberdade mantinha o ardor apaixonado de afixar um faiscante «VILA HELENA» à altura do primeiro andar na esquina da casa de habitação, virado para a rua, a idolatrar a mulher”.[2] Abel manteve esta quinta durante cerca de duas décadas. No entanto, pouco tempo passarão em Couchel.[2] Em 1932, regista a Comarca de Arganil: “Vinda de Lisboa, encontra-se na sua explendida Vila Helena, a esposa do nosso amigo sr. Abel Ferreira Inácio,[10] que vem assistir às vindimas.”[11] Durante todo este período foi feitor da quinta Alfredo Ferreira de Carvalho, que vivia na Casa da Ladeira (a primeira à direita para quem sobe vindo da Estrada da Beira).[2]

Mas, conta-nos novamente Aniceto, “a Dona Helena não era dali, a província não era o seu meio, Couchel não era a sua terra…”.[2] É então que em 1943 a propriedade é novamente colocada à venda. “VENDE-SE uma propriedade em Poiares, no lugar de Couchel, composta de casas de sobrado, pátio para abegoaria e adega, com terras de semeadura, oliveiras e videiras, tudo num só bloco e grande testada de mato e pinheiros. Quem pretender, dirija-se ao local, à sua proprietária Helena Ferreira.”[12]

Foi assim que a quinta foi comprada a 22 de Setembro de 1943 por Tiago Ferreira Henriques, de Vale de Vaíde, comerciante de calçado no Porto e sobrinho de António Henriques, que também vivia em Couchel. Tiago viria a falecer no Porto em 1953[13] e a viúva, Adelaide Ferreira Henriques, natural da freguesia de Cedofeita,[9] ter-se-á desfazido da casa para ficar pelo Porto.[2] A propriedade é novamente anunciada nos jornais e é então que Adriano Francisco, natural de Penacova, após um negócio não conseguido no Luso, encontra esta quinta e a adquire, a 23 de Novembro de 1959, mantendo-a até aos nossos dias.

Algumas curiosidades sobre esta quinta:

  • No pátio encontra-se uma palmeira com frutos pequenos e esféricos de cor laranja (possivelmente uma palmeira Butia) bastante velha que terá sido trazida por um conterrâneo a quem chamavam o “Africano”
  • Existe um túnel antigo com cerca de 115 metros que liga dois dos poços da quinta
  • A descamisada, a vindima e a matança do porco eram momentos em que se juntavam nesta quinta uma boa parte dos habitantes da aldeia, tradições que se mantiveram por várias décadas

  1. Informação obtida através do myheritage.com.pt. ↩︎
  2. “Regresso a Couchel” de Aniceto Carvalho ↩︎
  3. Comarca de Arganil, 18-09-1919 ↩︎
  4. Penacova Online ↩︎
  5. Gazeta de Coimbra, 13-12-1923 ↩︎
  6. Comarca de Arganil, 01-01-1924 ↩︎
  7. Comarca de Arganil, 10-01-1924 ↩︎
  8. O anúncio é do final de 1923. No entanto, a escritura celebrada entre Albertina Nogueira Vaz e Abel Inácio Ferreira tem a data de 21 de Maio de 1922. Ainda assim, a descrição da «Vila Albertina» corresponde à desta quinta e é improvável que se tratasse de outra em Couchel. De notar que Albano d’Andrade foi tesoureiro da Fazenda Pública na Lousã, e que estes assuntos em Poiares eram tratados na comarca da Lousã. ↩︎
  9. Informação que consta na escritura da propriedade. ↩︎
  10. Incorrectamente referido como “Abel Ferreira Inácio”. Aparece no entanto correcto aquando do seu falecimento, na Comarca de Arganil de 18-08-1951. ↩︎
  11. Comarca de Arganil, 20-09-1932 ↩︎
  12. Comarca de Arganil, 13-08-1943 ↩︎
  13. Comarca de Arganil, 18-04-1953 ↩︎